"Eu sou o que me cerca. Se eu não preservar o que me cerca, eu não me preservo".
José Ortega y Gasset

quinta-feira, 30 de maio de 2024

Conversar com pessoas mais velhas: uma experiência na Nova Rússia, Blumenau-SC.

No campo da História Ambiental, conversar com pessoas mais velhas é uma prática enriquecedora que oferece ao pesquisador uma riqueza de informações. Estas memórias fornecem subsídios valiosos para a reconstrução do passado e ajudam a fundamentar o cenário histórico. A memória possibilita pistas que são essenciais para que o historiador possa reconstruir o ambiente histórico. Nesse contexto, a História Oral se destaca como um método fundamental, onde a memória é falada, gravada, transcrita e, finalmente, transformada em um documento. Esse processo permite que o historiador, combinando com outras fontes documentais, elabore uma interpretação mais complexa do passado ambiental de uma região.

Nesta experiência, uma série de estudos realizados por pesquisas de Iniciação Científica no GPHAVI, financiadas pelo PIBIC-CNPq, Artigos 170 e 171 do Governo do Estado de Santa Catarina, e projetos FAPESC colaboraram com a construção do conhecimento. Havendo assim a participação de diversos estudantes e pesquisadores do grupo. Desde 2003, o grupo iniciou uma pesquisa na localidade da Nova Rússia, uma pequena comunidade rural isolada na Floresta Atlântica, localizada no bairro Progresso, em Blumenau-SC. Esta comunidade, situada em uma geografia de vales profundos e tendo o Rio Garcia como principal curso d’água, possui uma história rica que começou com a colonização por Hermann Bruno Otto Blumenau em 1850, tendo como principais motivadores a exploração florestal e mineral. A região, colonizada a partir de 1890, viu a chegada de alemães, prussianos, poloneses, italianos e brasileiros, que sobreviveram e desenvolveram a localidade através da exploração dos recursos naturais.

Garrote (2006) destaca que Nova Rússia passou por um intenso processo de exploração da madeira, palmito, caça e outros elementos da biodiversidade. A partir de 1980, o movimento ambientalista local, liderado pela Associação Catarinense de Preservação da Natureza (ACAPRENA) e membros da comunidade, começou a promover a conservação da natureza. Como resultado, a Companhia Artex comprou terras nas cabeceiras do Rio Garcia, protegendo mais de 5.300 hectares e instituindo o Parque Ecológico Artex em 1988. Em 1998, a FURB, FAEMA e a Prefeitura de Blumenau criaram o Parque Natural Municipal Nascentes do Garcia, que serviu de embrião para a criação do Parque Nacional da Serra do Itajaí (PNSI) em 2004, abrangendo 57 mil hectares em nove municípios.

A beleza da paisagem, mesclando áreas rurais com a Floresta Ombrófila Densa, e a vontade de documentar o processo de ocupação e colonização da região de Nova Rússia e outras comunidades ao redor do PNSI, estimularam o projeto "Investigando a História Ambiental das Comunidades do Entorno do Parque Nacional da Serra do Itajaí".

Documentário Memórias do Parque
O projeto foi desenvolvido para estudar a memória ambiental dessas mas 32 comunidades do entorno do PARNA Serra do Itajaí. De 2004 até 2020 o grupo desenvolveu estudos, e os resultados da experiência estão dispersos em diversas publicações nos anais de eventos, revistas, assim como nos relatórios de pesquisas de IC, TCCs, Monografias, Dissertações e Teses de Doutorado do grupo.

Conversar com os mais velhos é uma experiência fascinante para um historiador. Em um mundo dominado pela escrita e pelo registro formal, corremos o risco de silenciar vozes essenciais para a compreensão do nosso passado. As pessoas mais velhas, são guardiãs de memórias vívidas e experiências únicas que transcendem os documentos frios e os livros empoeirados. É aí que reside a importância crucial de conversar com elas, de registrar suas histórias e de dar vida a essas memórias através da história oral.

Através da gravação e transcrição cuidadosas das conversas, transformamos a memória oral em um rico material de pesquisa. Mais do que meras palavras, essas histórias são portais para o passado, revelando detalhes, nuances e perspectivas que jamais encontraríamos em documentos oficiais ou fontes escritas. É a memória viva tecendo a tapeçaria da história, complementando os fatos com as vivências, as emoções e os valores de cada época.

No seu estudo, a memória ambiental ganha destaque, tornando-se uma ferramenta valiosa para compreender as transformações do ambiente ao longo do tempo. As memórias dos mais velhos nos permitem traçar um panorama vívido das paisagens do passado, dos recursos naturais disponíveis, das relações entre o homem e o meio ambiente e das mudanças sofridas ao longo dos anos. São relatos que nos ajudam a entender como o homem moldou e foi moldado pelo seu entorno, fornecendo dados preciosos para a gestão ambiental presente e futura.

Ao darmos voz às memórias dos mais velhos, não apenas enriquecemos a pesquisa histórica como também celebramos a sabedoria e a experiência das gerações passadas. Criamos pontes entre o passado, o presente e o futuro, tecendo uma narrativa mais completa e humanizada da nossa história. Através da história oral, honramos a memória viva e garantimos que suas vozes continuem a ecoar, inspirando e guiando as novas gerações.

Um dos estudos publicados em anais de evento que gostaríamos de compartilhar, assim fazendo um TBT GPHAVI, é o estudo A memória ambiental em pesquisas de história: experiências no entorno do Parque Nacional da Serra do Itajaí – SC, publicado nos Anais do XIV Encontro Estadual de História - Tempo, Memórias e Expectativas, que ocorreu entre 19 a 22 de agosto de 2012, na UDESC, Florianópolis, SC. Leia o estudo, clique a seguir:

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