"Eu sou o que me cerca. Se eu não preservar o que me cerca, eu não me preservo".
José Ortega y Gasset

domingo, 5 de junho de 2016

Dia do Meio Ambiente e 12 anos de Grupo de Pesquisas de História Ambiental do Vale do Itajaí na FURB

O Grupo de Pesquisas de História Ambiental do Vale do Itajaí comemora seus 12 anos de criação no mesmo dia que se comemora o Dia Mundial do Meio Ambiente. Essa história é contada na entrevista cedida à equipe do GPHAVI pelo pesquisador Martin Stabel Garrote (MSG), um dos fundadores do grupo:

-GPHAVI: Martin, gostaríamos que você contasse um pouco da história do grupo de História Ambiental, sobre suas atividades, participantes. Como começou essa história?
-MSG: Olá. Veja só. Essa história do grupo começa quando entrei na graduação de História na FURB, em janeiro de 2002. Na época o curso tinha duas habilitações. Primeiro você fazia a Licenciatura e depois o Bacharelado. Desde o início do curso os professores falavam do TCC, do tema, como escolher o assunto, e as correntes teóricas para analisar um determinado problema. Eu não sou de Blumenau, e não tinha tema formado ainda. Mas gostava muito dos temas relativos a Educação Ambiental, e da Problemática Ambiental. Aqui na Universidade diversos temas já haviam sido trabalhados, como as enchentes, enxurradas,  gênero, mundo do trabalho, associativismo, história da educação e etc. Eu estava buscando então um novo tema, ou uma nova abordagem. E reparei que entre os colegas e professores da História, a questão ou problemática ambiental, do que os humanos causam no meio não era um tema estudado, havia esse vazio. Logo no início do curso me casei com Vanessa (o grande amor de minha vida), estudante de  biologia, passamos a compartilhar assuntos na área. Um desses assuntos era a História Natural, isso em 2002. Mas o Historiador não tem formação para pesquisar História Natural, não é de sua alçada. Da História Natural se derivou as Ciências Naturais, como o que ocorreu aqui na FURB. Pois bem. com esse incomodo iniciei a procurar então na História, algo que se aproximasse. Na biblioteca não achei nada relativo ao que estava pensando, a não ser o livro A Ferro e Fogo, de Waren Dean (o único livro que citava a História Ambiental por um historiador,  no acervo da época da BC - o livro já era trabalhado nas Ciências Biológicas, e Vanessa o conhecia), bingo. Nessa época havia a internet, mas poucos bancos de pesquisas. O forte era o cade?, a Google estava chegando, ganhando confiança, e ali procurei também, e encontrei o termo eco-história, em espanhol historia ecológica, e em inglês environmental history, e achei Donald Worster, o que me possibilitou encontrar seu artigo publicado em 1991 traduzido para português, e que havia sido postado na internet. Achei o que procurava, agora faltava o que pesquisar aqui em Blumenau, pois me encantava pela história local. E comecei a aprofundar essa pesquisa. Ao mesmo tempo, amante da natureza, gostava muito de ir tomar banho de rio, e já em 2003 conheci a região da Nova Rússia, no Sul de Blumenau com olhos de historiador (ando). Tendo um pouco da leitura de Dean, Worster e Drummond, olhei o vale e a ocupação e fiquei interessado de fazer o que Dean fez para a Mata Atlântica, mas num recorte menor, pegando essa comunidade histórica incrustada na floresta, e no entorno de uma Unidade de Conservação. Elaborei um projeto e como estudante procurei meus professores para submeter o projeto no PIBIC CNPq. Imagina, naquela época, um aluno fazer o projeto  e captar recurso! Nem hoje isso acontece! Pois bem, no curso de História haviam apenas dois doutores que me poderiam auxiliar, a professora Bia, e o professor substituto Marlon. Nessa época apenas os doutores poderiam submeter IC, e estes tinham que ser do quadro, fato que descartou o professor Marlon. E a professora Bia, mesmo gostando da ideia estava com muitos projetos em andamento, e não poderia ter mais um.  Foi nesse momento, durante as aulas de Geografia Física, estudando o livro de John Perlin, História das Floresta, que conheci o professor Gilberto (doutor em Geografia), que não era professor de história, e sim de geografia, e com esse livro apresentava algo muito próximo a proposta da História Ambiental, que na geografia pode ser encarado como Geografia Histórica ou Geo-História. Perguntei a ele se ele conhecia a História Ambiental, mas disse que não sabia do termo, só conhecia o livro de Perlin, que se associava ao que eu estava argumentando. Em um dos trabalhos da disciplina, na elaboração de um painel, caprichei, e fiz nos moldes científicos, como um banner de evento, me destacando. E posteriormente a avaliação de sucesso, apresentei a proposta da Iniciação Científica ao professor. Gilberto aceitou e disse que toparia, mas eu deveria correr e fazer a documentação, os tramites burocráticos, que ele assinava o formulário. Pois bem, fui me informar e enormes desafios surgiam. O primeiro deles é que o CNPq passou a exigir que os pesquisadores tivessem os projetos vinculados a grupos de pesquisa. Gilberto me passou seus dados de acesso a plataforma e através do site deles, entrei e criei a primeira versão do grupo: História Ambiental da Mata Atlântica do Vale do Itajaí no Século XX. O projeto foi submetido e algum tempo depois veia notícia que ele havia sido reprovado. Putz! Mas o mesmo projeto havia sido recomentado para o PIPe, outro programa de IC. E em 2004 foi iniciada a pesquisa, até que em junho, é criado o Parque Nacional da Serra do Itajaí, o que estimulou a ampliação da pesquisa. E como o parque integrava o coração do Vale do Itajaí, mudamos o nome do grupo, sendo criado o Grupo de Pesquisas de História Ambiental do Vale do Itajaí. O seu  primeiro registro, nome, no portal de grupo do CNPq, fiz na madrugada do dia 4 para o 5, já era sábado foi terminar. Coincidiu de ser no mesmo dia que se comemora o dia do meio ambiente. Que sorte né? Outro fato é que em 2005 quando era coordenador do CAHClio Centro Acadêmico de História, organizamos a Semana Acadêmica "Ofícios do Historiador" e tivemos a presença de Jó, que me informou do LABIMHA e me deu um bom impulso nos estudos dentro da História Ambiental. Me formei em 2005, e essa primeira pesquisa de IC, e a criação do PNSI motivaram a criação do grupo.
-GPHAVI: Depois de formado, como você participou do grupo. Você ingressou como professor na FURB?
-MSG: Não, só entrei como professor em 2012, como substituto. E foi no departamento de Ciências Sociais. Eu participei  e participo como voluntário, pesquisador colaborador. Entre 2005 e 2006 o GPHAVI era apenas um grupo de registro no CNPQ, não fazíamos reuniões, não tínhamos um espaço, não atuei na FURB, peguei aulas na rede pública, município, e comecei uma pós-graduação em História Social na ISULPAR através do CEUNI Blumenau, e resolvi aprofundar a pesquisa no parque, tendo o orientador o professor Gilberto. Isso fez agente se unir, fizemos churrascos, tomamos cervejas, papeamos e começamos a pensar nas possibilidades de desenvolver o grupo na universidade, aproveitando o edital Universal lançado pela FAPESC.  Obtivemos exito, desenvolvemos uma pesquisa e conseguimos comprar equipamentos, computador, gravador, impressora, fone de ouvido. Os recursos chegaram em 2007 e a pesquisa terminou em 2009. Como precisávamos de um espaço o professor Gilberto conseguiu alocar o início de nosso laboratório dentro da sala do Departamento de História e Geografia. Aí vieram as pesquisas de Iniciação Científica, comecei a escrever os projetos e encaminha-los pelo Gilberto, para concorrer aos programas de IC. Nesse momento, tinha 4o horas na rede em aulas, e quando tinha o dia de janela, de planejamento, ia para a FURB.. No meu pensamento, com a criação do parque, a Nova Rússia era umas das 32 comunidades de entorno que apontavam os mapas do Pano de Manejo do PNSI, e a ideia era pesquisar todas e construir uma História Ambiental do Parque Nacional da Serra do Itajaí. Em 2007 tínhamos a pesquisa FAPESC em andamento e conseguimos um PIPe. Selecionamos com entrevista uma bolsista e demos início nas pesquisas na Nova Rússia e Faxinal do Bepe, Indaial. Neste ano enviamos mais um projeto para o FAPESC - PMUC, que foi contemplado, analisando Guabiruba, e tivemos 2 pesquisas do PIBIC-CNPq aprovadas, analisando Botuverá, o que garantiam recursos para a logística da pesquisa. Com isso estávamos em 4 bolsistas e o Gilberto, ocupando o espaço do dep, que mal cabiam os professores. Quando eles chegavam, abarrotava a coisa, e começou a gerar algumas questões que, de certa forma, favorecem politicamente com a direção do centro, no futuro, a criação de um espaço. Além disso, eu estava mestrando no PPGDR, e havia uma sala de estudos que mal era usada pelos mestrandos, e como eu era bolsista capes, passei a usa-la diariamente. Em conversas com o professor Ivo em 2009, o laboratório foi para a sala R-310, onde hoje é a secretaria do programa. Era um quadradinho. E ali os bolsistas tinham um espaço com computador e internet. A partir de 2008 eu escrevia 2 PIBICs e 3 PIPes por ano, isso foi até 2013, quando Gilberto começou também passou a redigir conteúdos para os projetos de pesquisas nas IC, e importar algumas atividades do ab que participa na Arquitetura. Algumas ideias reescrevemos, outras renovamos e assim por diante. As ideias surgem do acumulo do conhecimento e do que interessava a nós três, eu, Vanessa e Gilberto (História, Biologia, Geografia). Como me dedicava mais, acabava escrevendo mais, e escrevia projetos para organizar meu estudo de doutorado, que faço agora. A pesquisa do parque avançou, estudamos, Apiúna, Vidal Ramos, e Nereu Ramos, conseguimos dar a volta no parque com iniciações científicas. Diversos bolsistas vieram para contribuir. Bolsistas da história, ciências sociais, engenharias, administração, biomedicina etc. Até que em 2010, com conversas e apelos, o diretor do Centro, na época o Clovis, habilitou uma sala de aula do bloco R para serem criados espaços para grupos de pesquisa. O curso de Serviço Social que tinha seus laboratórios dentro do dep deles também precisavam de espaço. E então fizemos a mudança da sala do programa para a  sala que hoje é o CCHC. Ficamos ali de 2010 até que em 2012 ocorrem reformas no centro e a mudança do espaço dos grupos para a R-109, reformas que possibilitaram o espaço que hoje está aqui no laboratório. Depois conseguimos mais um FAPESC, que possibilitou uma super ampliação no nosso espaço, e laboratório. Hoje o grupo possui as Iniciações Científicas, estamos com 1 PIPe, 1 PIBIC, e além disso temos 2 pesquisas vinculadas com doutorandos no PPGDR, eu sou um deles. Já fizemos IC de Ensino Médio, e projetos em parceria com ONGs e Institutos. Hoje também participamos de um projeto especial da universidade, participando do Plano de Manejo do Parque Municipal Freymund Germer em Timbó. Também, fizemos pesquisas em Campo Alegre, Morretes, Camboriú, no Canal do Linguado, Doutor Pedrinho. O laboratório ou GPHAVI surgiu assim, com muita batalha voluntária, buscando apoio aqui, outro lá. caçando editais para recursos, com o trabalho dos bolsistas, essa é um pouco da história. No blog tem um histórico que foi escrito um dia, não lembro bem dele, mas se pesquisarem vão achar. Bem, hoje é o aniversário do grupo, e ele existe por um grande empenho e esforço voluntario, e não seria possível estarmos aqui sem esse apoio da pesquisadora Vanessa, que junto comigo, voluntaria desde 2004. E do auxílio e parceria com o professor Gilberto, que possibilitou essa história aqui na FURB, inicialmente ele ficava distante, mas aos poucos foi participando. Hoje o GPHAVI participa como grupo no PPGDR, e temos a linha de pesquisa História Ambiental e Desenvolvimento Regional. O grupo e a História Ambiental aqui na FURB vejo como área consolidada e o laboratório é reconhecimento institucionalmente.
-GPHAVI: O que o professor pensa sobre o futuro do grupo no contexto atual?
-MSG: Bem, viviamos um acréscimo gradual de recursos na pesquisa. A política nacional mudou, e os interesses dos investimentos vão diminuir na pesquisa básica, principalmente nas Ciências Humanas. No último edital da FAPESC isso já ficou evidente, não havia nenhum projeto de História, por exemplo, era um edital universal para o sistema ACAFE. Vejo a corrupção em muitos níveis crescendo, fato que dificulta o bom desenvolvimento. Mas o maior problema, pensando localmente e globalmente, é a consciência coletiva, a sofisticação do modo de vida engrenada pela sofisticação do consumo de massa, e essa mentalidade que gera uma cultura. O estudante chega aqui envolvido nisso, e não consegue refletir temas e problemas de pesquisa que discutam a realidade e proporcionem a sociedade novo pensamentos sobre os fatos. Da mesma forma, o que escrevemos aqui não é lido pelas massas. É uma pena, que desde quando tudo isso começou, o grupo e tal, e ainda hoje, depois de vivermos todos esses problemas socioambientais, civilizatórios, os problemas de pesquisa não norteiem para campos de análise como os propostos pela História Ambiental. Por que o estudante de História não se interessa pela história local? Por que não agrega os fatores que evidenciam nossa crise civilizatória em seus estudos? Por que você faz um curso na Universidade? Para que serve a Universidade no nosso contexto civilizatório? Vejo a História Ambiental uma área muito relevante para o que a ciência deve fornecer para a  melhoria da vida humana.  Eu fico torcendo para que apareça um estudante na graduação de história, ou na de geografia, ou de outra área, não há diferença, mas que venha com uma proposta crítica, e tenha proatividade e voluntariado de desenvolver a pesquisa e o grupo. Eu e Vanessa estamos ficando velhos e sem poder voluntariar tantas horas, são 12 anos vindo para a FURB, lendo, escrevendo e orientando. Fazemos isso porque gostamos de fazer isso, de conhecer a História Ambiental Local, e  Gilberto também. Tendo isso em vista, e olhando para o laboratório, hoje e para o futuro, espero que os alunos se interessem mais pelas pesquisas, pelos seus assuntos, e que fiquem apaixonados, e não ter o pensamento do recurso da bolsa como um pretexto. O estudante deve refletir sobre o seu modo de vida, sobre suas ações e diminuir a hipocrisia entre a narrativa e ação, esse é o desafio de nós todos aqui na humanas. E que outros professores se interessem pela área e venham participar, venham proporcionar um espaço de produção de conhecimento crítico e de certa forma prático para a vida humana. No GPHAVI já tentamos muitas coisas, muita coisa boa e ruim já aconteceu, vale até um artigo. Mas fica para outro momento. Agradeço vocês e espero ter ajudado com o histórico, até. 
-GPHAVI: Agradecemos a participação do professor, e parabéns GPHAVI.
(Entrevista concedida em 05/06/2016)

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